Manifestações em Vitória e arredores.
Rogério Coimbra.
Na década de 1830, por
razões religiosas, surgem em Vitória as bandas Caramuru e Filarmônica
Rosariense. Pertenciam a irmandades devotas a São Benedito. A sede dos
Caramurus era o Convento de São Francisco, na Cidade Alta, onde ainda está
conservada parte de sua edificação enquanto que, os Peroás, tinham sede na
Igreja do Rosário,essa ainda com seu aspecto original, em cima da atual Rua do
Rosário. Essas duas bandas eram presença em todos acontecientos em Vitória,
desde os cultos religiosos até solenidades políticas, passando pelo carnaval.
Mas há que separar o técnico do improvisado.
Grupos musicais formados por negros alcançaram notoriedade e reconhecimento
desde a chegada de D. João VI em 1808. A corte ficou deslumbrada pelo que ouviu
em vários pontos da colônia. Eram as orquestras de escravos.
No Espírito Santo há notícia de um grupo
musical de escravos, registrado pelo Bispo do Rio de Janeiro, D. José Caetano
da Silva Coutinho, em 1812, quando pernoitou em Araçatiba. Relata o bispo:
“Vim dormir no belo e bem conservado Hospício dos
Jesuítas, que hoje é morada e a principal fazenda do meu amigo Falcão, onde
ouvi a boa música dos seus escravos...”
Sete anos mais tarde, em 1819, o bispo D. José
Caetano retorna ao Espírito Santo e dessa vez registra:
“No dia 20 vim embarcado para a fazenda do Padre
Torquato no sítio Barra no formoso Jucu no sítio Jucuruaba, fazenda do
boníssimo Joaquim José Fernandes, senhor de 8 músicos que me têm acompanhado
constantemente mas que não me parecem tão bons como os de Araçatiba e crismei
umas duzentas pessoas que deram onze patacas. Ladainha cantada e acompanhada a
órgão pelo incomparável João Barbosa, e muita gritaria por toda negraria.”
Não há muitos registros mas consegue-se captar nas
entrelinhas das narrativas a força do duo tambor-viola, evidentemente
sustentado pelo descendente africano e indígena, que mais tarde evoluiria para
formação das congadas.
Ganhou literalmente terreno
a força do tambor aliada à viola e à espontaneidade da dança. O duo
viola-tambor era a base da música popular emergente. O brasileiro adota essa
forma como expressão mais significativa.
Em suas viagens pelo
Espírito Santo, o Príncipe Maximiliano, em 1815, registrou a fabricação da
viola aliada ao tambor:
“A três léguas da capitania – Vitória – conseguimos pouso para a pequena
‘povoação’ de Praia Mole. Ali numa verde planície um pouquinho acima do nível
do mar encontram-se esparsas várias habitações. Numa delas encontramos amigável
acolhimento; e como todos habitantes tivessem muito gosto pela música, fomos à
tardinha, agradavelmente entretidos com música e dança. O filho do hospedeiro
que era muito hábil na fabricação de guitarras (violas) tocava e o resto da
meninada dançava o ‘batuque’ entregando-se a estranhas contorções do corpo,
batendo palmas e estalando dois dedos de cada mão alternadamente, imitando as
castanholas dos espanhóis. Embora os portugueses tenham grande talento natural
para a música, não se vê pelo Brasil outro instrumento senão a ‘viola’.”
Já em 1818 Auguste de
Saint-Hilaire, ao passar pela região do atual município de Aracruz, registrou:
“Saindo de Barra de Riacho encontrei a uma meia légua de sua embocadura
vastas pastagens e um lugarejo habitado por índios civilizados que cultivam a
terra e criavam gado. [...] Neste distrito os índios civilizados fazem viola
para seu uso com a madeira de jenipapeiro e uma outra madeira branca e
extremamente leve da qual o nome é tajibibuía.”
Quanto à citação da imitação
das castanholas não é de se estranhar esse hábito por aqui pois os espanhóis
vieram para o Brasil desde o início da colonização. O padre Anchieta era
espanhol. A viola, o violão e as castanholas vieram da península ibérica.
Apenas para ilustrar, eis um relato do Padre Antunes Siqueira sobre um cena de
rua em Vitória, cerca de 1850:
“Um grupo de 12 meninos, dirigidos por dois guias,
cantavam e dançavam ao som das castanholas. Dialogavam aqueles em versos
portugueses e castelhanos, e convidavam-se reciprocamente para as folias das
festas.”
______(continua)______
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