segunda-feira, 22 de agosto de 2011

HENRIQUE VOGELER E A CANÇÃO BRASILEIRA.



Tive a sorte de assistir há cinco anos a um espetáculo intitulado “A Canção Brasileira” Acompanhava sua temporada no Rio de Janeiro pelos jornais, lia depoimentos dos atores e produtores e, sobretudo, aguçava minha curiosidade em conhecer de perto “A Canção Brasileira”. Genial o espetáculo. Trata-se de uma opereta com libreto de Luis Iglesias e Miguel Santos e partitura de Henrique Vogeler, cuja estreia deu-se em 31 de março de 1933. No elenco, entre outros, Gilda de Abreu e Vicente Celestino

Esse espetáculo foi retirado de cena em 10 de agosto do mesmo ano com 300 representações. Cinco anos depois, em 1938, excursionou por São Paulo e Porto Alegre, retornando ao Rio de Janeiro, completando 600 representações. Um detalhe notável: Vicente Celestino e Gilda de Abreu casaram-se oficialmente durante uma representação, quando ele fazia o papel do Samba e ela da Canção Brasileira. Vamos à história.

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Essa genial historieta, concebida no início dos anos 30, narra de início o casamento do Lundu e da Modinha, personagens devidamente representados, cuja união gera o nascimento da Canção Brasileira. Uma grande festa foi dada para comemorar o acontecimento com a presença de ilustres convidados como o Sr. Tango e Miss Charleston. Eis que nessa festa aparecem três penetras, a Flauta, o Violão e o Cavaquinho, uma típica turma de chorões que, aproveitando um descuido dos anfitriões, sequestram a Canção Brasileira e a levam para um morro carioca qualquer. A trama da opereta gira o tempo todo em torno de como se resgatar a pequena e inocente criança. Os anos se passam e a Canção Brasileira torna-se uma formosa mulher e que cresceu no ambiente popular do morro, convivendo com o Samba desde criança; o desdobramento é previsível, com um inevitável romance entre os dois que, apaixonados, resolvem se casar. 

Nesse meio tempo, o Sr. Tango, muito enxerido, sobe o morro em busca de algo exótico e de repente descobre a Canção e a associa à sua amiga de longa data, a Modinha, que teve um dia sua filha sequestrada; ele não só leva ao morro a Modinha como revela à Canção sua verdadeira identidade. O buzu foi formado e a decepção da Canção com seus amigos que a criaram é imediata; ela quer conhecer a cidade e passa a detestar a todos, principalmente seus sequestradores, o Trio Flauta, Violão e Cavaquinho, e ao Samba.


A Canção deslumbra-se com a cidade e marca casamento com o Sr. Tango, para total desespero do Samba que, para vingar-se, resolve casar-se com Miss Charleston. Bem, a historinha se desenvolve e, claro, para um final feliz: a Canção Brasileira reencontra-se com seu amor de raiz, o Samba. Agora o subtítulo da opereta: “A História De Amor Que Gerou o Samba-Canção”.

A genialidade de tudo isso é essa visão de estrutura de uma música que se formava então, há  80 anos, uma visão iluminada, pois o que não é hoje o emblema da música brasileira senão todas as variações do samba, do batuque e do jongo?


Vale registrar a riqueza das canções de Henrique Vogeler e de seus arranjos originais, que ficaram adormecidos desde 1938 até 2005 e que, em 1928 compôs a música que é considerada o nosso primeiro samba-canção: “Linda Flor” (Ai Iôiô, eu nasci pra sofrer .....), gravada em 1928 por Vicente Celestino e  Francisco Alves, com o título “Meiga Flor”, com letra de Freire Jr. e, em 1929, por Araci Cortes, com a letra definitiva de Luiz Peixoto.  Outro registro: essa música tem nada mais do que cinco letras diferentes, escritas por: Freire Jr., Cândido Costa, Luiz Peixoto, Marquês Porto e Nelson de Abreu.


Um último registro: Henrique Vogeler morou por uma pequena temporada em Vitória na década de 20, provavelmente para reger orquestras de salão ou de cinema. Compôs para o Espírito Santo a “Canção da Minha Terra”, com letra de Ciro Vieira da Cunha e que todo capixaba, beirando os 70 ou mais, tem registrado na memória pois era cantada em toda escola, principalmente no tempo do Estado Novo.  O saudoso professor Renato Pacheco o cita no livro “Os Dias Antigos” (PMV, 1998). Vogeler era o braço direito de Villa Lobos no Conservatório Nacional, no final dos anos 30 e início dos 40. Faleceu em 1944, aos 56 anos.


A “Canção Brasileira” foi um excelente espetáculo um espetáculo dirigido por Paulo Betti .

Texto originalmente publicado em abril de 2006 em www.taru.art.com

3 comentários:

  1. Eu vi este musical, fez grande sucesso no Rio, casa cheia. Como eu acho que a maioria que assistiu nunca tinha ouvido falar em Henrique Vogeler mas conhecia suas músicas. Bacana o resgaste do Paulo Betti. Bacana este seu artigo sobre esse compositor incrível e esquecido.
    Elisa

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  2. Que bom, Elisa, que tenha assistido também.
    Achei uma montagem super criativa em cima de um texto estimulante e visionário, além da belíssima trilha do Voleger.
    Coisa boa a gente não esqueçe.
    Um abraço

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  3. Preciso voltar a Vitória, vejo pelo seu blog que a vida musical da cidade está animada! Abços, Elisa

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