segunda-feira, 26 de setembro de 2011

PAULO MOURA, UM SOPRO BRASILEIRO.

Esta resenha foi originalmente publicada no suplemento Pensar do jornal A Gazeta, ES.



Paulo Moura, Um Solo Brasileiro.


A memória do músico Paulo Moura, falecido há um ano, é ativada através do lançamento do livro “Paulo Moura, Um Solo Brasileiro”, escrito pela psicanalista Halina Grynberg, casada com Moura por 26 anos e que também foi sua empresária e produtora musical. Trata-se de uma coleção de depoimentos cedidos à sua mulher, em forma de entrevistas. O seu conteúdo é rico e a narrativa revela os primeiros anos desse grande músico, seus primeiros passos profissionais, seu convívio familiar, sua evolução e seu conhecimento. Os depoimentos foram interrompidos infelizmente devido à doença que o vitimou em 12 de julho de 2010, aos 77 anos.

O projeto gráfico é refinado, numa edição bilíngüe presenteando o leitor com o  CD  inédito“ Fruto Maduro”,  produzido pelo músico e parceiro André Sachs. É o resultado de gravações ao longo de cinco anos, consequência de um laboratório experimental que reunia semanalmente músicos como Cliff Korman, Daniela Spielmann, Zé Carlos Bigorna, Laudir de Oliveira, entre muitos, no estúdio de Sachs, no Rio de Janeiro. Há preciosidades harmônicas e melódicas que bem demonstram o estágio musical em que se encontrava o clarinetista, inclusive com incursões à música eletrônica no estilo “fusion”.

Paulo Moura narra sua vida de forma envolvente, dede sua infância em São José do Rio Preto, SP, sua ida para o Rio de Janeiro, com a família, especificamente para o bairro Tijuca onde criou amizade com João Donato, Bebeto Castilho e Pedro Paulo, suas participações em grandes orquestras das emissoras de rádio Nacional e Tupi, seu ingresso na Orquestra do Teatro Municipal, como primeiro clarinete, suas primeiras gravações, seus primeiros arranjos e sua entrada no mundo jazzístico com Sérgio Mendes, Edison Machado, Tenório Jr e Cannonnball Adderley.

Também presentes em sua narrativa  notáveis esclarecimentos sobre a técnica de execução de seu instrumento, desde o sopro ao dedilhado, análises musicais sobre harmonia, e interpretação. Ele não esconde seu entusiasmo pela música de John Coltrane chegando mesmo a compará-lo ao compositor Wagner e como ambos os músicos contribuíram para o desenvolvimento da harmonia. Ele admite ter sido influenciado por  Benny Goodman.

A apurada técnica ao clarinete foi revelada em 1956 quando gravou um 78rpm com a música “Moto Perpétuo”, de Paganini, num lado, e, no outro, “O Voo do Besouro” de Rimsky-Korsakov, disco esse que o tornou conhecido junto ao público e aos músicos. Aliás, em certo momento de sua carreira, Paulo Moura quase que suplicava para que não pedissem que ele, depois de anos, voltasse a executar o “Moto Perpétuo”, tornando-se seu grande estigma. Seu primeiro prêmio em concursos de solistas foi um par de sapatos.

“Paulo Moura, Um Solo Brasileiro” é um livro especial, envolvente para músicos e para todos aqueles que amam a música, e também para os que se interessam pela história de um período da nossa sociedade. Infelizmente ele não conseguiu sobreviver para descrever para o leitor o DNA da música brasileira que ele tanto demonstrava em suas gravações a partir dos 1970, uma dedicação às raízes tão variadas que estruturam essa música respeitada em todo mundo.

Dois dias antes de falecer, na Clínica São Vicente, RJ, amigos como Wagner Tiso e Daniella Spielman gravaram o último solo de Paulo Moura. Debilitado, mas com grande esforço para sobreviver, com seus costumeiros vivos olhos, arregalados e azuis, Paulo Moura anuncia sua partida. Apesar de melancólico, é um importante registro do último momento desse grande músico.

 O endereço no Youtube é: http://youtu.be/U6thzv0n6Xc

Quem acompanhou a carreira de Moura através de seus discos pode bem perceber momentos de ruptura tais como quando se afastou do jazz para aproximar-se mais do choro e, depois da música popular urbana e então para a mais miscigenada. Discos como “Confusão Urbana...” (1976), “Mistura e Manda” (1983), “Dois Irmãos” (1992), “El Negro Del Blanco” (2004), são alguns títulos emblemáticos, sem esquecer-se do delicioso “O Som de Dorival Caymmi” (1991) ou mesmo o “Gershwin & Jobim” (2000). Afinal, são mais de 30 títulos. Sobre eles o maestro não teve tempo de comentar. 

Seu legado fonográfico está no CD”Fruto Maduro”, encaixado no livro, no qual há o indicador de como fluía sua música nos últimos anos.  Lamentavelmente o solo brasileiro de Paulo Moura foi interrompido. Fiquem com a faixa "Trem do Moura", parceria com André Sachs.<

3 comentários:

  1. A simplicidade de Paulo Moura não expos exatamente a grandeza de músico que ele era.
    Um dos nossos grandes talentos. Basta recorrer à sua discografia.
    Ernani Salles.

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  2. Meus caros Lester e Ernani,
    Paulo Moura merece. sim, todas as homenagens.
    Para reviver, sugiro o disco com músicas de Caymmi e o Gershiwn & Jobim. Fantásticos.
    Abraços.

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