segunda-feira, 19 de setembro de 2011

SALSA, UM SOPRO NO INTERIOR.


Entrevista originalmente postada em taru.ART.br em 17/03/2006. Atualmente Salsa afastou-se da cena capixaba e suas performances estão focadas no magistério, exatamente em Colatina, interior do ES.


Luiz Salsa Romero, mutimídia, saxofonista, produtor musical, comentarista de discos, psicólogo, professor de literatura. Destaca-se como incentivador de bons momentos musicais na ilha.

1.Salsa você nos últimos anos tem sido um dos mais destacados provocadores de espaços e apresentações de música instrumental (jazz, bossa & choro) aqui pela ilha, haja vista a movimentação da Curva da Jurema, as antigas terças do Bar Balacobaco e em outros lugares também. Conta como e quando você fez surgir esses movimentos e as quais resultados você acha que chegou? E em quais outros espaços que se pode fazer musica instrumental em Vitória e redondezas?

— Eu sempre fui muito descarado com esse lance da música. Mal aprendi a tocar uma escala e fui encarando a ribalta. O povo devia sofrer muito, mas eu, no afã de tocar um instrumento, não dava muita bola para crítica (autocrítica, então, nem pensar). Esse aspecto, posso afirmar, ajuda bastante na hora de encarar umas paradas, digamos, pouco ortodoxas. Comecei a tocar o tal do jazz com mais dois jovens músicos (Pedro Alcântara [16 anos] e Gustavo Mendonça [18]), ainda no início dos noventa, num restaurante próximo à terceira ponte (Yesterday). Esse foi o primeiro espaço que encarei: tocamos durante quase um ano, com um público sempre receptivo. Depois eu toquei durante um tempo com Fabiano Araújo (na época ele era um aluno cdf de engenharia e depois largou tudo e foi para Campinas cursar música) no já fechado restaurante Mão Na Massa, da nossa amiga Mônica. Um ponto bastante importante, quando se fala em inaugurar espaços, é nos cercarmos de gente que também encara qualquer parada. A receita é simples: músicos jovens. A rapaziada fica louca pra sair das garagens. Nesse primeiro tempo (anos 90) a fonte de músicos era (e continua a ser) a banda da Escola Técnica, dirigida pelo gente finíssima e grande incentivador (fica ali no basfond, sem dar as caras) e “criador de músicos” maestro Célio. Eis uma pessoa que merece uma homenagem. Bem, indo aos finalmente, o jazz na Curva, de fato, foi peitado por mim e pelo Duda (primeiro dono do quiosque de mesmo nome), que me convidou para tocar rock dos anos 60 e 70 na segunda-feira (o Paulo, dono do Plataforma dezesseis, e que ainda está lá, entrava com a reclamação na hora de pagar). Eu fiz a contraproposta de tocar jazz e ele (o Duda) encarou. Os músicos vitorianos (os mais antigos) não gostam de amadores, ou seja, era difícil arranjar companhia para tocar. Assim sendo, chamei a moçada do The Rover, banda que tocava e ainda toca covers de Led Zepelin, Hendrix, Deep Purple e por aí a fora, formada por Ricieri (guitarrista, depois foi pra BH estudar música e fez mestrado na Bahia) que depois foi substituído pelo Wanderson Lopes, Kako Zorzal (baixo) e Ziel (baterista e motorista de ambulância). A mídia sempre foi muito simpática e apoiou a iniciativa que, desde o início, contou com um público de faixa etária bastante heterogênea (aquela história dos oito aos oitenta) e fiel. A Alma do movimento, a meu ver, é a informalidade do espaço, o clima de improvisação (a quantidade de músicos que apareciam para as canjas era enorme) e a persistência (mesmo em noites de chuva, lá estávamos), fatos que não ocorrem nos bares “fechados” que existem na ilha. Tocamos durante quatro meses (de fevereiro a maio de 2000), até consolidar o evento. O sucesso da Curva proporcionou o surgimento de outros lugares para se tocar jazz, mas o clima nunca foi igualado. Atualmente temos, além da Curva, três lugares para tocar: o Jazz Café, o Café Touché (cujo maior inconveniente é não querer pagar aos músicos: é pelo couvert ou nada feito) e o recentemente aberto Teacher’s Pub (às terças) e, dizem, não tenho certeza, o também recém-inaugurado Bliss abrirá suas portas para a música instrumental. E, essa é em primeira mão, a partir de março, vamos invadir o centro da cidade: tocaremos (eu, Norberto Finn, Fausto e Diego) na Caverna do Simpson. Esse é um lugar que eu gostaria que funcionasse. O clima do centro da cidade sempre me atraiu.

2. Capixaba conhece capixaba e gosta dele? Há uma identificação, uma demanda de nomes por parte do público? Quem são os nomes mais conhecidos e celebrados dentro do movimento da música instrumental na noite?

— Na última década, o nível dos nossos músicos tem se elevado bastante (refiro-me ao universo dito jazzístico). Muitos saíram para estudar e, ao retornarem, estão formando um montão de gente boa (a abertura das faculdades também ajuda). Alguns já se consolidaram como referência para os jovens músicos: os pianistas, arranjadores e compositores, Pedro Alcântara, Fabiano Araújo e Turi Collura são três deles. Acrescentemos os nomes dos guitarristas (esses não faltam) Fábio Calazans, Wanderson Lopes, Zé Moreira, Bruno Mangueira, Gean Pierre e mais uma porrada que não me recordo agora. Os nossos baixistas ainda são muito eletrificados e em pouco número: Paulo Sodré, Caco Dinellis, Fausto, Otávio (de vez em quando ele toca jazz). Saxofonistas são os irmãos Paulo, Sérgio Rouver e Sérgio Meirelles (?) (o professor da Ufes). Trompetistas, por enquanto, só o Marcos Firmino e Daniel Dias. Bateristas: Edu Szajnbrum, Joãozinho, Dudu, Diego. Essas pessoas são mais conhecidas entre os próprios músicos. Nós temos um grande problema referente à divulgação da produção da rapaziada (rádio e TV parece existir apenas para o som pop). O preconceito ainda existe (do próprio público, inclusive, que não conhece e não quer conhecer por achar jazz coisa de intelectual). Já ouvi várias pessoas falarem, surpresos, depois de ouvirem o som, que não imaginavam que houvesse tal coisa em Vitória.

3. A remuneração do músico na noite obedece a regras? Há algum tipo de organização por parte dos músicos? Existe uma tabela, mesmo que informal? Qual o nível do profissionalismo local? Tem daquele tipo: ah, por esse cachê eu não toco, o mínimo é tanto... Vá rodar um CD !

— Que mané regra! É uma esculhambação geral. Como eu disse acima, tem gente que nem paga. A rapaziada vai lá só pra ensaiar e descolar um rango e umas cervejas. Pra conseguir descolar uns cem merréis é a maior trabalheira. Na maioria das vezes (refiro-me aos bares) os valores circulam entre 50 e 75 para cada músico. E ainda se ouve frases tipo: “você não está trabalhando, está se divertindo”. São poucos os que estabelecem um cachê e não abrem mão.

4. Você é conhecido por sempre projetar uma nova safra de músicos locais, os newcomers. Quem você destaca com um futuro garantido? Que dica você dá a eles?

— Estou tocando com três jovens: Diego (bateria), Alexandre (piano) e Fausto (baixo). Mas tem mais um monte de gente por aí. Citei um monte na segunda pergunta. Tem uma coisa no trabalho do músico (creio que serve para qualquer um que se envolva com arte e entretenimento): é um serviço de nômade. Tem que viajar. Acrescente-se uma dose de humildade, descaramento e estudo. Esse papo de autodidata é a maior furada. Falo por experiência própria.

5. Quais os cinco temas que não podem faltar numa apresentação de Salsa e executados em quais instrumentos?

— "In The Walked Bud" e "Boulevard Blues", de Monk (eu toco com o sax alto), "Summertime", de Gershwin (alto e tenor), "Bud’s Blues", de Bud Powell (alto), e, por fim, uma que eu não tenho tocado, mas gostaria: "Goodbye Pork Pie Hat", de Mingus (tenor).

Fiquem com Salsa(sax alto) Fabiano Araujo(piano) Paulo Sodré(baixo) e Diego Frasson (bateria) em " Lá Se Vai O Embaixador", do folclore capixaba.


7 comentários:

  1. Ué, o músico virou professor, no interior ? Parece filme de TV. Que missão, hein?
    Gostei do sopro. Espero que seja um ótimo professor porque, como músico, ele é bom.
    Abração.
    Ernani Salles

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  2. Delícia de sopro.
    Uma briza, mora !
    Beijão.

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  3. Rogério, excelente idéia e excelente entrevista com Dr. Luiz Romero. Continua fazendo isso, cara. É o registro do presente em benefício do futuro. Só estranhei Dr. Romero não ter citado o Wunderbar.

    Gostei também do episódio anterior, E la nave va (o contrabaixo de Afonso), que li anteontem.

    Abraços,
    Reinaldo

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  4. Meu caro Reinaldo,
    A entrevista é de março de 2006, quando o Wunderbar ainda não existia.
    Obrigado pela visita.
    Um abração.

    PS: Não se esqueça do clube amanhã; anote num papelzinho.

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  5. Grande entrevista com um grande sujeito!
    Mr. Salsa é "o cara"!
    Abração!

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  6. Mr. Cordeiro,
    Compromisso é compromisso.
    Dia 29, quinta, na SBPowell, defronte onde morreu Antônio Maria, esquina de Copacabana e Fernando Mendes.
    Obrigado pela visita.

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