sexta-feira, 1 de abril de 2011

HISTÓRIA DA BOSSA NOVA EM VITÓRIA.- Parte V.




Voltando alguns anos, em 1958 e 1959, o foco seria o Hotel Império, propriedade da família do violonista, hoje médico, Evanilo Silva. Lá costumava se hospedar o Trio Irakitan, até então um modelo de vocalização para a turma que se modernizava. Ao lado do hotel havia o Bob´s, lanchonete também da família. Tudo acontecia ali. Evanilo Silva disse à Ana Nahas:


Meu pai era músico, mas não tocava profissionalmente. Só em rodinhas de violão e serenata. Meu irmão tinha um american Bar chamado Bob´s. Nem tinha cerveja. Tinha o hotel do lado que era do meu pai e os músicos do Rio, como oTrio Irakitan, ficavam no hotel. Antes de fazerem o show ficávamos ali com eles. Vinham para shows nos cassinos. Cariê trazia as harmonias para gente. Cariê canta muito bem, você sabe. Isso tudo foi aumentando o gosto musical da gente e a aproximação das pessoas. A bossa nova influenciou a nossa vida, despertou amizades. Final de semana tinha sempre um lugar pra ir e todo mundo começou a tocar no estilo bossa nova. Vieram as festas do Praia.. Aí começamos eu, Reinaldo Brotto e Luiz Paulo Dessaune a ensaiar coisas ali no Bob´s.


 Vitória se modernizava e a referência era o Bob´s da Rua Sete, no centro da cidade, pertinho da Costa Pereira. Em seu depoimento Reinaldo Brotto declara com entusiasmo:

O Bob´s mudou completamente o estilo, a arquitetura de bares em Vitória. Era uma lanchonete, mas era de luxo, com uma iluminação, um ambiente da moda. Era na rua Sete e ao lado tinha o restaurante de Abido Saade, de comida árabe, então ali concentrava o pessoal que tinha dinheiro, que ia pro Abido e quem não tinha ou tinha pouco, ia pro Bob´s, tomar uma coca-cola, lanchar. Freqüentava naquela época todo mundo de Vitória, Vânia Sarlo, Mirinha e Raquel Lopes, Penhoca Linhares, Nilze Coimbra, Nelsinho Monteiro, Celso Saade, Marilio Cabral, Heraldo Brasil, Antonio Henrique Wanderley, Rostan Castello,  Regis Bonino Joel Cabral,Vitor Sarlo. Evanilo Silva era filho do dono do hotel Império e que  tocava trombone. Música lá só quando o movimento esfriava. A gente entrava e tocava violão, bongo. A turma ficava sentada em cima do carro de Marilio Cabral, um Oldsmobile  Só ele tinha carro e a gente ficava no carro tocando violão e cantando, na rua. Quando chovia a gente passava pro bar. O motivo principal era o encontro para bate-papo, depois é que veio a música. Essa coisa de música moderna começou a circular quando veio a Vitória o Trio Irakitan. Por acaso Luiz Paulo Dessaune e Evanilo Silva os conheciam e nós três começamos a imitá-los. Depois veio Os Cariocas, Quatro Ases e um Coringa. A gente ia muito pro Rio. A turma embarcava no carro de Marílio Cabral e enfrentava aquela estrada horrorosa, pra passar o fim de semana. Ainda não se falava em Bossa Nova.

Vitória respirava música. A cidade sempre esteve ligada ao movimento da Bossa Nova. Maysa foi um capítulo a parte, sempre por aqui,sempre disposta a cantar, a qualquer hora. Cantar e namorar. Teve uma época que ela se apaixonou por Zé Costa, deixando o Ronaldo Bôscoli. Zé Costa ficou igual a um pavão. Maysa é que puxava tudo. Ela era muito animada. Iamos dormir, lá pelas quatro e ela já combinava: amanhã a gente se vê no Cauê. Que horas? Dez horas. Dez? Ninguém dorme? Quem a acompanhava sempre ao violão ou era Cariê ou Evanilo.

A Bossa Nova foi mudança de atitude, um afastamento daquela geração antiga que dominava o país. O meu conceito de Bossa Nova é que ela é mais um estado de espírito do propriamente uma técnica Era uma mentalidade de jovens que não eram anarquistas;
Eram jovens que eram modernos que queriam mais liberdade ou até mesmo libertinagem, mas sem bagunça. Você nunca ouviu falar em bagunça num ambiente de bossa nova, no Beco das Garrafas, por exemplo. Havia um excesso para o diferente, sem anarquia. E apareceu pela primeira vez a modéstia da estrela. Tipo João Gilberto. ( continua).

8 comentários:

  1. E essa história continua, aliás, uma bela e rica história.
    Esse tempo devia ser muito bom mesmo, amizades, muita música doméstica mas de boa qualidade. Não havia a TV Globo- rsrsrsrs
    Ernani.

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  2. A Bossa Nova foi e sempre será o momento mais importante da nossa ´MPB.Adoro a Bossa Nova, adoro João e Tom e tudo o que tem a ver com Bossa Nova. Amo!

    Um Abraço,
    Ester Mazzi

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  3. Caros Ernani e Ester.

    Naquele tempo realmente era outra energia, com a natural competição humana, mas sem predação alheia. Como sambista vendia música, vide Noel, Cartola e outros, sem a preocupação do ego destruidor. E não havia a TV Globo, verdade.
    E a Bossa Nova, Ester, nasceu com um estilo muito difícil de desaparecer; nem um tsunami apaga a BN.
    Obrigado pela visita de ambos.

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  4. A história da bossa nova já está no capítulo V. Quantos capítulos você ainda tem na manga para publicar,mr.Rogério ???? Dependendo da quantidade, poderia futuramente transformar-se em um interessante livro, pois as "historinhas" são muito boas.

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  5. Rogerio,
    com relação à Bossa Nova, quero dizer também que em pouco espaço de tempo, a Bossa Nova espalhou-se pelo mundo inteiro, vide Frank Sinatra e Jobim, Stan Getz entre outros. Já há um bom tempo atrás que as grandes cantoras de Jazz estão cantando e gravando Bossa Nova,então, a Bossa Nova está mais viva do que nunca e se fixou para sempre no cancioneiro mundial.
    È isso.

    Um abraço,
    Ester Mazzi

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  6. É um prazer tê-lo aqui, Predador, muito mais com esse espírito conciliador e pacífico.
    A Bossa Nova tem esse efeito, é "cool".
    Ainda há muitas historinhas sobre o movimento da bossa nova em Vitória.
    Obrigado pelo incentivo. Volte sempre.

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  7. Concordo que essas histórias dariam um livro muito rico e gostoso de ler. )Para quem viveu o tempo e participou, o prazer da recordação; para as outras gerações, um histórico precioso.
    Elisa

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  8. Elisa, bom que você voltou.
    Assim vocês me animam a contar mais histórias.
    Não sei em qual geração você se encaixa, mas o prazer da leitura pertence a todas elas.
    Volte sempre.

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