terça-feira, 1 de março de 2011

HISTÓRIA DA BOSSA NOVA EM VITÓRIA - Parte 2.



                                                  História da Bossa Nova em Vitória - Parte 2.
                                                                                           Rogério Coimbra.




Nossa cidade é impar e é par. Contraditória em seus ventos, sul e nordeste e com parcos moradores naquele tempo do início dessa música encantadora. Era em torno de 50 mil habitantes. Ouviu-me? Leu-me? 50 mil. O congo e a casquinha de siri eram exclusivos de quintais do entorno. Quem introduziu a casquinha de siri para a classe média foi Cirilino,que havia sido chefe do bar do Iate Clube e que depois assumiu o comando do lendário bar Miramar na Praia Comprida, em frente ao trampolim. Cirilino foi o primeiro a expor num balcão de bar salgadinhos como coxinha de galinha, empadas de camarão e a desconhecida casquinha de siri. Enquanto isso a muqueca era uma iguaria exclusiva das casas de família, em qualquer nível. Muqueca em restaurante só em ocasiões especiais ou para visitantes e somente no restaurante São Pedro ou na casa de Dona Sarah, ambos na Praia de Suá, ou no próprio bar Miramar, então ainda sob o comando de Walter e Antônio. Os pescadores chegavam com seus peixes na praia do Canto e o cação era rejeitado, o baiacu amaldiçoado e o linguado, a maria-sapeba, ignorado. Diversidade em Vitória ? Difícil, estava tudo malocado. A ponga era uma instituição pois os carros eram poucos: raramente um adulto permanecia por muito tempo nos pontos de ônibus ou de bonde pois era imediatamente recolhido pelos poucos privilegiados motoristas para serem levados aos seus destinos: centro da cidade ou o aglomerado de bairros da zona norte. A jornalista Ana Nahas ouviu de Cariê Lindenberg:

Minha filha, não tinha nem paralelepípedo nem asfalto, era tudo chão de terra, entendeu? As pessoas de fora adoravam. A cachorrada começava a latir e a gente cantava umas músicas bonitas para acalmar. Era um negócio inusitado o pessoal cantando na rua.

Com seu ar bucólico, típico dos anos 60, Vitória soube bem à época, abrigar uma saudável energia que emanava da então onda musical que se estendia pelo país: a Bossa Nova. A nova música surgira no final dos anos 50, filha do samba, porém mais cândida, leve, mas não tão ingênua, pois sabia chegar perto das pessoas, cativá-las e deixar sua mensagem, transparente e ao gosto de corações que descobriam uma nova vida, assim como o próprio país descobria o seu crescimento. Nas inquietações das metrópoles, ou seja, na agitação do Rio de Janeiro ou de São Paulo, qualquer busca de sossego encontraria em Vitória a serena morada para um repouso revivente.


 Em seu discreto silêncio Vitória já fora berço de nomes importantes para o movimento como Roberto Menescal ou Nara Leão e por pouco, de Maysa, pois seus pais eram capixabas.


 É falado que foi em Vitória que Menescal tangeu seus primeiros acordes no violão que lhe daria fama depois; afinal nativos como Evanilo Silva, Moacir Barros, Cariê Lindenberg, Jorginho Seadi, Afonso Abreu, Carmélia de Souza, José Maria Ramos, entre tantos, só seriam motivo para se fazer e curtir música. Foi o sossego discreto de Vitória que permitiu que em 1962 para cá viessem Maysa, Ronaldo Bôscoli, Luiz Carlos Vinhas, Bebeto Castilho e o próprio Menescal para ficarem meses a ensaiar para uma grande turnê nacional. Cariê foi amigo e companheiro de canções de Newton Mendonça desde seus tempos de serviço militar no Rio, amizade que perdurou até a última hora.


 Eram amizades e interesses em comum e Vitória tornava-se a hospedeira gentil de poetas e cantadores. Era para Vitória, graças às amizades do  Cariê , e de Luiz Paixão e sua irmã Sônia, que vinham amigos como Geraldo Vandré, Silvinha Telles, Sergio Ricardo, Bené Nunes, Vinicius de Moraes, o Carlinhos Bruno, irmão de Lenita Bruno, pioneira de gravações das composições de Tom e Vinicius e, por que não citar, Diza, filha do compositor Oswaldo Santiago,a musa que ganhou o famoso tema de Johnny Alf com seu nome. E ela foi ciceroneada por Luiz Paixão que, como bom guia turístico à época, sem possuir automóvel, não se constrangeu em atravessar a baia num pequeno bote a remo até Paul, e pegar um bonde para mostrar à Diza as belezas da Praia da Costa. (continua).




Texto original na Revista do Festival Vitória Bossa Nova (2008)




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2 comentários:

  1. Vitória dos anos 60 era tudo de bom. Lindo seu texto, transmite toda a beleza e encanto daquela época. Aguardo a continuação.
    Elisa

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  2. Vitória ainda guarda um certo bucolismo. A gente tem que saber onde ele se escondeu.

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